Projeto O que é camarão?

A insistente pergunta de um aluno dá origem a inúmeras atividades que aumentam os conhecimentos infantis sobre os animais aquáticos.

Tudo começou de forma muito simples, como são simples também as crianças. Ao iniciar um dia de trabalho em turmas de Educação Infantil, músicas variadas são propostas para os alunos. Canta-se para tudo nessa faixa-etária: para lanchar, para sair da sala, para trocar de atividade.

Assentados no chão, em roda, iniciamos um dia de trabalho com uma turma de crianças de três anos: cantamos muitas músicas, contamos as novidades de casa, combinamos a agenda do dia e uma música muito apreciada por todos foi iniciada.

 O tubarão (domínio público)

Zip zap, zip zap, lá vem o tubarão. Zip zap, zip zap,

como é grande o tubarão.

Foge, peixinho, esconde, siri.

Cuidado, camarão, que lá vem o tubarão.

Num determinado momento, em que a cantávamos, um aluno perguntou: “O que é camarão, professora?”

Voltei a pergunta para a turma e cada um começou a pensar numa forma de explicar para o colega o que era um camarão. Uma criança disse: “É uma comida e tem rabo”. Outra falou: “Eu já comi na praia”. Em seguida, mais respostas: “Fica na água”. “É de comer.”

No outro dia, cantamos outras canções e, novamente, a do tubarão estava em pauta. No final, o mesmo menino que havia lançado a pergunta, no dia anterior, perguntou novamente: “Mas o que é camarão, gente?” Dessa vez, ele estava com um rostinho muito sério e de braços cruzados. Não podíamos deixar passar aquele momento, pois era evidente que as respostas do dia anterior não haviam sido suficientes para fazê-lo compreender o que era um camarão. A turma foi convidada a visitar a biblioteca da escola para procurar informações nos livros. Cada vez que conversávamos e líamos algo sobre o assunto, observávamos que o interesse das crianças aumentava mais e mais. Folheando livrinhos de histórias, uma delas encontrou uma gravura de peixe e logo mostrou para a professora. Outra mostrou, com alegria, um camarão que havia encontrado em um livro sobre o mar.

Continuamos a cantar a música “O tubarão” nos dias que se seguiram. Passamos a ler histórias relacionadas com o assunto e sempre recordávamos sobre a pergunta daquele dia, mas ainda sabíamos pouco sobre o bichinho. Pedimos, então, que as crianças perguntassem em casa sobre o camarão e, no dia seguinte, chegaram algumas respostas.

Como o assunto estava “pipocando”, mantivemos contatos com livros sobre animais marinhos e propusemos uma pintura para representar o mar. A ideia foi imediatamente aceita e as crianças adoraram pintar, vestidas com suas camisetas grandes para proteger os uniformes da tinta.

Num outro dia, o saco de novidade foi o destaque. Dentro dele havia algo que foi motivo de bastante interesse das crianças. O saco foi passando de mão em mão e todos iam apalpando o seu conteúdo. Como regra, não valia abri-lo. Depois que todos o apalparam, chegou a hora de descobrir o que era. Não foi difícil. Uma criança disse com convicção que dentro do saco havia uma estrela-do-mar e ainda acrescentou que a sua irmã tinha uma daquelas. O saco foi aberto e a estrela­ do-mar foi passando pelas pequenas mãozinhas, enquanto algumas informações sobre ela eram trocadas.

No dia seguinte, a coisa ficou ainda melhor. Uma caixa grande e bonita foi colocada bem no centro da roda. Todos queriam saber o que havia dentro e tentavam adivinhar, enquanto as dicas iam sendo dadas: não é de comer, não é de brincar… A turminha estava ansiosa! Por fim, apareceram muitas novidades: estrelas-do-mar grandes e pequenas, caramujos, conchas e até um cavalo-marinho. Como faziam comentários e perguntas! Muitas hipóteses e informações foram trocadas, impulsionadas pelas peças que circulavam pela roda.

A pintura do mar, realizada anteriormente, foi colada no mural e as crianças coloriram recortes de peixinhos para compor o painel. Fizeram, também, pinturas usando esponjas sobre moldes vazados de peixes, estrelas-do-mar e cavalos-marinhos. Mas… e o camarão? A pergunta ainda continuava no ar e sem grandes explicações. Resolvemos envolver os pais com um pouco mais de ênfase no estudo. Foi enviada para casa uma cartinha solicitando uma pequena pesquisa com os filhos, respondendo à pergunta: “O que é camarão?” Como crianças de três anos ainda não conseguem esperar por muito tempo, as pesquisas  foram  enviadas alternadamente para pequenos grupos, a serem apresentadas em dias diferentes. Cada criança deveria expor em sala, para os colegas, o estudo feito em casa. À medida que as pesquisas foram retornando e sendo mostradas, o interesse pelo assunto foi aumentando mais e mais. Com as apresentações, as informações sobre o camarão também foram aumentando.

Beatriz Ribeiro, uma das alunas mais entusiasmadas, mostrou com alegria a sua pesquisa. Relatava, gesticulando as mãos, que existem camarões pequenos e grandes, mostrando, nesse momento, uma lita para indicar o tamanho do camarão grande. Nicole aprendeu e contou para os coleguinhas que o camarão come tudo que encontra pelo seu caminho.

Um dia, além da pesquisa encomendada, Júlia, chegou com uma sacola grande.Seus olhinhos brilharam ao dizer o que havia dentro da sacola. Ela contou que o camarão é um crustáceo,  vive no mar  e nos rios, tem dez patas,serve de alimento para os peixes e para o homem e é muito gostoso. Depois, mostrou a surpresa que estava na sacola para os coleguinhas: um isopor cheio de gelo com camarões inteirinhos e fresquinhos. A turma vibrou! Todos queriam ver, tocar e conhecer o camarão. Eles pegaram, sentiram o cheiro. Alguns não gostaram. Contamos o número de patinhas que o camarão possui, observamos o seu corpinho, a cabeça, os olhinhos suspensos e tudo mais que foi possível explorar. Depois, a turma fez um desenho de observação, analisando a forma, a cor, enfim, os detalhes do camarão. O desenho ficou lindo e foi exposto no mural da sala.

Com o interesse crescendo a cada dia, não poderia faltar uma ex­ cursão. Foi o que propusemos e todos adoraram a ideia. Mas, precisavam ter a autorização do pai e da mãe. As crianças acompanharam o processo da confecção da cartinha e, no dia em que ela foi colada na agenda, todos já sabiam qual era o recado que deveriam dar aos pais.

Enquanto esperavam pelo grande dia, mais descobertas foram apresentadas. Amanda Oliveira trouxe, entre outras informações, que os camarões comunicam entre  si  soltando bolhas. Ela  e  sua  mãe fizeram  um lindo origami com camarões.

Lívia abriu janelinhas em sua pesquisa para dar respostas às perguntas sobre o camarão. Além das informações, fez uma linda colagem sobre o desenho de um camarão.

Enquanto o assunto crescia, o interesse das crianças era despertado para a beleza do fundo do mar e para tudo o que havia na natureza. Conversamos muitas vezes sobre a generosidade de Deus em criar tantas coisas lindas. A linguagem oral e a escrita foram muito utilizadas nos momentos das conversas, das leituras, da busca de informações em livros, da letra inicial da palavra camarão. A música estava presente o tempo todo, aliás, foi ela que deu origem ao assunto. E as artes? Ah! Que lindas produções artísticas as crianças estavam sendo capazes de produzir.

Algumas pessoas da escola também foram se envolvendo: coor­ denadores, diretores,  outros alunos apareciam sempre na sala para saber as novidades sobre o fundo do mar. E a cada visita, as crianças contavam sobre o que estavam estudando, mostravam os desenhos e as pesquisas. Podíamos ver a alegria, o entusiasmo ao falar do que estudavam. Queriam ensinar o que aprendiam. Na aula de Música, as crianças contaram as novidades do estudo e envolveram a professora que, imediatamente, se recordou dos tempos de sua infância e cantou uma linda música que tinha a palavra camarão.

Chegou o grande dia da excursão ao Mundo das Águas. Foi o local escolhido já que em Minas não temos praia e uma visita a uma exposição aquática cumpriria bem o objetivo que almejávamos.

Neste dia, uma aluna fazia aniversário e preparou em casa, com a ajuda de seu pai, uma coleção de ímãs de animais marinhos para oferecer  aos coleguinhas. Antes da excursão, fizemos muitos combinados e seguimos para o local. A turminha ficou encantada com as maravilhas que viram. Peixes dos mais variados, moreias, tubarões-lixa, corais, crustáceos e, entre eles, o camarão. Uma oportunidade fantástica para todos! As crianças faziam comentários, interrompiam o monitor para explicar­ lhe o que sabiam sobre os animais, batiam palmas quando os peixes dan­ çavam de forma diferente na água.

As pesquisas não pararam de aparecer!

No decorrer dos dias, mais pesquisas foram chegando e sendo apresentadas. Amanda Alves deu uma verdadeira aula sobre camarão. Tiago ensinou que o camarão tem o corpo comprido e coberto por uma casca e uma cauda que usa para nadar. Sofia mostrou gravuras de dois tipos de camarões: o camarão-bailarina e o camarão-palhaço. Milena reforçou o que é um crustáceo, explicando ter ele carne dentro e casca dura por fora, como a lagosta, o caranguejo e o siri. É preciso tirar a casquinha para comer a carne de dentro. Diferente do peixe que tem osso dentro da carne. Na vez do Gabriel, ele mostrou um desenho de camarão feito por seu pai e depois apresentou suas descobertas, também. A pesquisa da Juliana chegou cheia de janelinhas como a da Lívia. Em cada uma delas, novas informações iam surgindo.

Na sala de Arte, trabalhamos com argila. Peixinhos foram mode­ lados, pintados e, depois de secos, colados os olhinhos com lantejoulas brilhantes. Eduardo também fez uma linda pesquisa e ensinou que o camarão pode ser marinho ou de água doce. Já a Vívian fez sua pesquisa com muito gosto. Mostrou receitas que sua mãe faz em casa usando camarão. Além disso, ela também trouxe camarões envolvidos em gelo, dentro do seu baldinho. Bea rão pode ser marinho ou de água doce. Já a Vívian fez sua pesquisa com mui­ to gosto. Mostrou receitas que sua mãe faz em casa usando camarão. Além disso, ela também trouxe cama­ rões envolvidos em gelo, dentro do seu baldinho. Beatriz Patrus mostrou um livro com gravuras de camarão e trouxe informações coletadas por sua mãe que foram lidas pela professora. Uma delas foi sobre as cores do camarão. Eles podem ser coloridos ou transparentes, porém, depois de cozidos, todos ficam cor-de­ rosa. Álvaro desco­ briu que o camarão é pescado com redes ou gaiolas, tem um par de antenas e um par de pinças que podem machucar o nosso dedo.

Num   outro dia, uma experiência inédita! Recebemos a mãe da Júlia que veio fazer uma receita de camarão para a turminha. Ela distribuiu um camarão cru e fresquinho para cada aluno. Ensinou como limpá-lo. As crianças observaram as partes do corpo: a cabeça, as antenas, o rabinho, a casquinha que o envolve. Muitas tentaram e conseguiram limpar o camarão e outras preferiram apenas observar. Depois de limpos, foram cozidos numa frigideira e logo nos foi possível sentir um cheirinho delicioso. Viram surgir a cor rosada do camarão depois de cozido. Foram servidos e a maioria das crianças comeu e pediu mais. Que delícia! Mandamos uma carta para os pais para saber se algum aluno tinha alergia a camarão.

No dia seguinte havia mais uma pesquisa para ser apresentada. Rodrigo descobriu que o nome do camarão da água doce é pitu. Foi mais uma informação importante para todos. Milena e sua mãe fizeram peixinhos usando a técnica do origami para distribuir aos coleguinhas. Além dos peixinhos havia, também, uma poesia feita pela avó da Milena, que todos ouviram quando foi declamada pela professora:

 Suave como o peixinho

(Elda  Tamberi Soares)

Na água clarinha eu vi um peixinho, nadando… suave… bem devagarinho.

 Pensei bem depressa: “sou um menininho e posso aprender, olhando o peixinho”.

 Agora eu falo suave…baixinho, não grito nem brigo, com meu amiguinho.

 A todos eu trato com muito carinho. Com inteligência imito o peixinho.

Tínhamos agora um cardume de peixes para colar no mural e uma nova oportunidade para conversar sobre a natureza e o quanto podemos aprender com ela. Na sala de Arte, fizemos ouriços usando uma bolinha de argila e palitos de fósforo para representar seus espinhos. Fizemos corais com a técnica da pintura com esponja. O mural pintado de azul foi ficando cada vez mais enfeitado e colorido.

Na excursão ao Mundo das Águas, a turma conheceu o tubarão- lixa. Até passaram a mão em um deles que estava em exposição. Para trabalhar a textura, foi passada cola em um papel bem grande e, com a ajuda das crianças, tudo foi coberto com areia. Todas colaboraram e aquele pedaço grande de papel ganhou um grande significado: seria transformado no tubarão-lixa da sala.

Com o papel colado de areia, aos pouquinhos, foi sendo confec­ cionado junto com a turma, um tubarão-lixa, parecido com o que haviam visto na exposição aquática. O papel foi recortado em duas partes semelhantes e colado no formato de tubarão. Tínhamos um tubarão murcho, vazio. A turminha foi convidada a encher sua barriga. Cada criança fez muitas bolas de jornal amassado para encher sua barrigona. E ele foi ficando gordo, gordo, muito gordo! A alegria ao ver aquilo era geral! O produto final deu gosto de se ver: um lindo e enorme tubarão para enfeitar a sala.

E os camarões? Ah! Os camarões foram feitos em casa com a família. Um desafio e tanto! Enviamos uma cópia, do passo a passo do origami mostrada pela Amanda Oliveira, no dia da apresentação de sua pesquisa. Foi mais uma forma de envolver as famílias. Cada criança trouxe de casa o seu camarão e, em sala, fizeram uma pintura sobre ele. Depois de pronto, para onde ele foi? Para o mural, é claro!

Depois de todas as apresentações, o mural ficou lindo com a co­ laboração de todos. Mas, o que fazer agora? Como dar continuidade ao estudo? Já haviam feito uma excursão, pesquisas, conhecido e até provado o camarão. Aprendemos para ensinar, mas como ensinar o que aprendemos? Tínhamos um grande conhecimento e muito material. Estávamos preparados para passar uma rica experiência, um rico conhecimento. Mas, como faríamos para repassar o que aprendemos?

Compartilhar o saber é um dever!

Em nossa escola há uma atividade intitulada “Momento de vinculação” quando as turmas têm a oportunidade de saber o que está ocorrendo com a outra. Então estava definido: faríamos um momento de vinculação com a presença de todas as crianças do Infantil e dos pais que tanto contribuíram com o projeto. Assim, começamos a nos preparar para a apresentação. Iniciamos os ensaios com microfone e tudo. Depois, convidamos as outras turmas e também os pais. Novamente estávamos diante de um grande acontecimento: a nossa festa!

Uma exposição foi montada especialmente para o momento. Nela estavam todos os trabalhos artísticos produzidos pelas crianças ao longo de dois meses de trabalho. Enfim, chegou o grande dia e, preparadas e a postos, começaram a apresentação que não poderia iniciar sem a música”O tubarão”.

Mas, o que é camarão? Na medida em que o microfone ia passando, cada criança ia dando o seu recado, contando o que havia aprendido sobre o estudo realizado. Se uma ou outra não conseguia manifestar o que havia aprendido, não tinha problema, pois todas sabiam e logo se dispunham a ajudar o colega. Cantamos novamente a música do tubarão e, para a surpresa de todos os convidados… eis que entra no salão uma de nossas crianças vestida de camarão (pintado por todos na sala) passeando pra lá e pra cá, como se estivesse nadando. E uma outra surpresa também foi preparada com muito carinho para ser oferecida para os convidados: animais marinhos feitos de chocolate. Um sucesso!

Como dissemos no início do texto, este projeto foi desenvolvido numa turma de crianças de três anos, e, mais uma vez, fica evidenciado que os assuntos escolares, quando tratados ao gosto das crianças, ganham vida e uma dimensão muito maior do que se pode imaginar.


Relato de experiência de Edna Aguiar Miranda Maia –  pedagoga, especialista em Educação Infantil e professora do Colégio Logosófico – Unidade Funcionários (Belo Horizonte – MG).

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