Projeto Africanidade – Mãe África e suas riquezas

Projeto permite o cumprimento da Lei 10.639 ao trabalhar a cultura afro-brasileira nos níveis fundamental e médio, alcançando visíveis resultados.

“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e, se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar.” Nelson Mandela

Diversas pesquisas demonstram que o racismo, em nossa sociedade, constitui, também, ingrediente para o fracasso escolar de alunos. Estatísticas apresentadas pelo Ministério da Educação (MEC) apontam para um pior rendimento escolar de estudantes negros do 5º ao 9º ano do Ensino Fundamental. Desigualdades socioeconômicas, preconceito e discriminação de pessoas negras estão presentes na sociedade brasileira, prejudicando a sua formação de maneira mais justa e inclusiva, englobando o âmbito escolar. Na escola, a história afro-brasileira e africana, tradicionalmente, é retratada com o foco implícito de submissão, exploração, desvalorização do negro, levando o aluno a absorver/valorizar aspectos negativos sobre sua etnia, contribuindo para a baixa autoestima, não aceitação e não reconhecimento da sua origem, traços, história e batalha por mudanças na sociedade, com cobrança de seus direitos e oportunidades. Tendo em vista esses problemas, diversas ações governamentais e não governamentais já foram discutidas e implementadas, incluindo políticas de reparações, reconhecimento e valorização do negro. Resgatar e valorizar a história e cultura afro-brasileira e africana é um passo inicial rumo à reparação humanitária para o povo negro brasileiro, pois abre caminho para a nação brasileira adotar medidas para corrigir os danos materiais, físicos e psicológicos resultantes do racismo e de formas conexas de discriminação.

O projeto foi idealizado a partir desta demanda. Teve caráter inovador, com ações pedagógicas que proporcionaram a discussão do tema na escola, envolvendo os alunos, com base em referências positivas através da história, da cultura e da política possibilitando, também, o trabalho interdisciplinar. Além do conteúdo de História, foi possível englobar as áreas de Língua Portuguesa, Literatura, Arte, Educação Física e, até mesmo, temas de Geografia e Matemática, a partir do trabalho com dados demográficos. Participaram do projeto alunos do 1° ao 5° ano do Ensino Fundamental, em grupos de 20 a 25 participantes, com idades diferentes.

Objetivos do projeto:
  • Ampliar o conhecimento da cultura e história africana estabelecendo relações com a cultura brasileira. – Discutir sobre o papel do negro ao longo da história.
  • Conhecer e valorizar as contribuições do negro em diversas áreas da cultura, tais como a música, literatura, culinária e artes.
  • Sensibilizar os alunos sobre o preconceito racial, suas formas e consequências, discutindo “brincadeiras que são sérias”, expressões e ações preconceituosas.
  • Romper imagens negativas forjadas por diferentes meios de comunicação.
  • Criar condições para que os estudantes negros não sejam rejeitados em virtude da cor de sua pele.
  • Discutir algumas conquistas em relação ao combate das desigualdades raciais e valorização da identidade e cultura negras.
O projeto na prática

Este projeto foi desenvolvido com um encontro semanal e duração de um semestre letivo. As atividades estão listadas a seguir:

  • Roda de conversa sobre o tema.
  • Teatro Menina bonita do laço de fita (Ática), de Ana Maria Machado, que mostra a diversidade cultural. Reflexão e sensibilização sobre a importância da cultura africana e Desenho da menina do livro, levando em conta sua cor e seus traços.
  • Narração da história sobre a escravidão e o trajeto do navio negreiro a partir do mapa-múndi e de um navio feito de palitos de picolé, enfatizando as contribuições positivas do negro naquela época, como jogos, dança, culinária, espírito de resistência e de luta.
  • Trabalhando com o mapa-múndi, aluno refaz o caminho dos navios negreiros.
  • Apresentação de diferentes estilos musicais e grandes mestres da música (Cartola, Gilberto Gil e Pixinguinha) relacionados à cultura afro- brasileira e africana (samba, semba, afoxé, jongo, maracatu, maxixe). Análise da letra da música “Aquarela do Brasil” de Ari Barroso.
  • Pesquisa sobre Zumbi dos Palmares. – Explicação e debate sobre quilombos e a atuação de Zumbi dos Palmares, mostrando a importância desses acontecimentos para a libertação dos escravos.
  • Visita à Comunidade dos Arturos, que é um quilombo na região de Contagem (MG). Esta comunidade tem sua origem ligada à história do negro Arthur Camilo Silvério, filho de escravo. Portanto, mantém importantes tradições da cultura negra brasileira, transmitidas de pai para filho, desde aspectos culinários e cultivo da terra até a organização da vida comunitária. Relato da visita através de desenhos e textos. Conversa sobre os melhores momentos do passeio.
  • Pesquisa sobre a maior e mais veloz serpente da África – a mamba, assinalando no mapa do Continente Africano onde ela vive. Foi construída uma mamba de pano, de acordo com o comprimento encontrado nas pesquisas, e feita pintura coletiva da cobra. Em seguida, os alunos vivenciaram a brincadeira africana mamba, em que uma pessoa é escolhida para ser a serpente, isto é, o pegador. O professor desenha no chão um quadrado de 10 X 10 metros, tamanho ideal para 20 crianças. Durante a brincadeira, todos os participantes permanecem dentro dessa demarcação, tentando escapar da serpente. Para começar a brincadeira, a mamba tenta pegar os jogadores. Cada participante que é tocado por ela se junta ao último do corpo da serpente. Se um jogador sai do quadrado é eliminado da brincadeira que acaba quando resta apenas um jogador a ser pego.
  • Leitura de alguns contos africanos do livro História africana para contar e recontar, de Rogério Andrade Barbosa (Editora do Brasil LTDA). O conto escolhido pelos alunos, “Por que a girafa não tem voz”, foi reproduzido em quadrinhos e poemas (3°, 4° e 5° ano). Os pequenos da fase introdutória fizeram releitura do livro.
  • Degustação de diversos alimentos e pratos culinários de origem africana: angu, pamonha, ovo cozido, cenoura, moranga, batata-doce, chuchu, feijão-branco, feijão-preto, aipim, quiabo, cana-de-açúcar, entre outros.
  • Explicação de antigos símbolos da arte iorubá (Nigéria) e sobre as máscaras africanas utilizadas em algumas tribos e seus significados.
  • Confecção e pintura, em grupos, de máscaras africanas.
  • Apresentação de slides com as diferentes esculturas produzidas por afro-brasileiros (mestre Valentim, Veríssimo de Freitas, Manuel da Cunha e Aleijadinho). Os alunos fizeram, com argila, em grupos, uma releitura das esculturas.
  • Estudo da biografia e de obras do pintor Marcial Ávila que, através da estética da beleza negra, procura despertar valores, virtudes e atenção da população a não discriminação por motivos de religião e etnia. Em seguida, foram feitas releituras com materiais diversificados da obra do pintor mineiro.
  • Palestra de um africano sobre a cultura, história e política de Angola e de outros países do Continente Africano. As perguntas apresentadas no debate foram elaboradas pelos alunos.
  • Discussão e reflexão sobre o preconceito racial contra o negro através de slides da tirinha da Mafalda.
  • Vivência e compreensão de alguns movimentos de dança afro- brasileira e capoeira que retratam a força e a luta do negro.
  • Avaliação feita pelos alunos da sua participação no projeto.
  • Exposição dos trabalhos dos alunos e das obras de Marcial Ávila.
 Resultados positivos

Após a realização das atividades do projeto, na escola, foi possível verificar o interesse, a participação e o envolvimento dos alunos e dos professores. Os temas foram levados para a sala de aula, o que viabilizou discussão com outros professores em suas respectivas disciplinas. Também houve relato de debates em família sobre o assunto. Dessa forma, o resultado final foi considerado positivo. O fato de mesclar alunos de diferentes idades nos grupos não prejudicou o andamento das discussões e, sim, enriqueceu o debate e a mostra das atividades artísticas. A discussão e a sensibilização de alunos para o respeito e a valorização da pessoa negra permitiram a mudança de atitudes por parte dos envolvidos. Dessa forma, foi possível contribuir para uma sociedade mais justa e inclusiva, minimizando preconceitos e discriminações. O aluno, independente de sua cor, teve a oportunidade de discutir e refletir sobre a questão racial. Entretanto, para isso acontecer, foi necessário que o professor fosse reeducado e capacitado para a questão etnorracial. Dessa forma, este trabalho, baseado em ações pedagógicas dinâmicas, interdisciplinares e com referência positiva, viabilizou maior nível de conhecimento e reflexão sobre questões raciais na escola e na sociedade e atendeu às exigências legais e curriculares. Na prática, foi possível ampliar o conhecimento dos alunos participantes sobre a cultura e história afro-brasileira e africana, discutir sobre o papel do negro e suas contribuições positivas para o Brasil, sensibilizar os alunos sobre preconceito e discriminação, resgatar-lhes a autoestima e, assim, viabilizar que o estudante negro explore suas potencialidades. A referência positiva aos estudantes negros agiu como um facilitador no processo de ensino/aprendizagem e na inclusão escolar.


Aline Tadeu Lopes é pedagoga, pós-graduada em Psicopedagogia Clínica e Institucional; Jaqueline dos Santos Martins Matias é pedagoga, pósgraduada em Psicopedagogia Clínica e Institucional e Andréa de Jesus Lopes é fisioterapeuta, mestre em Ciências da Reabilitação e professora no curso de Fisioterapia do Centro Universitário Newton Paiva (Belo Horizonte-MG).

 Este projeto foi classificado na categoria Ensino Fundamental, na IX Mostra de Inovações Pedagógicas realizada em Belo Horizonte, pelo Sesc/MG.

CONTATOS: www.sescmg.com.br | sescmg@sescmg.com.br

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