Pedagogia de projetos: paixão, dinamismo e inovação

A pedagogia de projetos invadiu o cotidiano de grande parte das escolas brasileiras. Atualmente há uma preocupação constante em desenvolver projetos didáticos e/ou pedagógicos em sala de aula. Na era dos games e da internet, das mensagens coloridas e rápidas, dos textos curtos e movimentados em flash, da interatividade e da globalização, projetar significa melhorar a educação e não continuar a manter o ritmo dos professores conteudistas com longas falas e cópias infindas.

As crianças parecem já nascer “plugadas”, conectadas, com múltiplos olhares e sentidos aguçadíssimos. Chegam à escola ávidas por novidades, por interação, desejam explorar tudo e todos. Ainda não sabem ler, mas navegam nos diferentes sites e, se não têm acesso à internet como meio de comunicação, são criadas em ruas movimentadas onde os estímulos variados criam nelas uma esperteza peculiar. Se ainda existem escolas despreocupadas com a realidade multimídia, certamente são tão poucas quanto as crianças não “plugadas”.

O renascer de Dewey e sua pedagogia ativa faz-nos ver uma luz no fim do túnel. Uma chave para o sucesso. Uma alternativa para educar significativamente as crianças e os adolescentes de hoje.

No Brasil, o trabalho com projetos ganhou força com a influência da educação espanhola, através dos autores Fernando Hernandez e Miguel Zabalza. Suas obras e propostas impulsionaram a busca por aulas contextualizadas e menos fragmentadas.

Se a metodologia baseada em projetos é mais atraente aos alunos, igualmente estimula os professores, movimentando-os, levando-os a romper a rotina mecânica de livros didáticos e buscar novas ideias, soluções alternativas, criativas e inovadoras. Motiva-os a pesquisar novas fontes, ler diferentes gêneros, manter o olhar atento ao que pode ser útil em sua empreitada.

Segundo Philippe Perrenoud, planejar, organizar e dirigir situações de aprendizagem é uma das competências que o professor deve ter para ensinar. Nessa concepção o movimento de projetar tem fornecido subsídios para uma pedagogia mais dinâmica, centrada na criatividade e na atividade discente, numa perspectiva de construção do conhecimento pelos alunos, mais do que na transmissão de conteúdo pelo professor.

Um trabalho eficaz baseado em projetos é refletido na postura dos educadores, tornando-se um desafio, uma forma de repensar a escola e o currículo, a pratica pedagógica em si. Nos ambientes escolares crianças com apenas três anos estudam Monet e cozinham, cantam e dançam tanto ao ritmo de Carmem Miranda quanto de Mozart e ainda escutam histórias da literatura de cordel. Não há mais espaço para a mera repetição, para a decoreba sem fundamento, para a história mal contada. Todo o conhecimento é uma espetacular surpresa. A pesquisa é crucial e a participação da família é valorizada e benquista.

Assim, o aluno chega ao Ensino Médio sabendo ter acesso às inúmeras informações, mas acima de tudo, sendo capaz de analisá-las e gerenciá-las dentro de um contexto, firmando-se em um agente transformador da sociedade, cidadão reflexivo e atuante.

Se ainda existem dúvidas de como elaborar um projeto ou da diferença entre projeto e sequência didática ou tema gerador, perto dos nítidos resultados obtidos com nossos alunos, isso é apenas um detalhe, a partir do momento em que o professor se dispõe igualmente a aprender como a ensinar.

O ato de projetar mudou a postura acomodada da escola, lançando nos educadores um gás de esperança.

“Os projetos de trabalho supõem, um enfoque do ensino que trata de ressuscitar a concepção e as práticas educativas na escola, para dar respostas (não “a resposta”) às mudanças sociais que se produzem nos meninos, meninas e adolescentes e na função da educação e não simplesmente readaptar uma proposta do passado e atualizá-la.” (Hernandez, 1998, p. 64)

A função do projeto é a de tornar a aprendizagem real e atrativa, tornando a escola um espaço agradável, sem impor os conteúdos programáticos autoritariamente. Assim, o aluno busca e consegue informações, lê, conversa, faz investigações, formula hipóteses, anota dados, calcula, reúne o necessário e converte tudo isso em ponto de partida para a construção e ampliação de novas estruturas cognitivas.

Dentro dessa perspectiva, os conteúdos disciplinares, antes teóricos e abstratos, deixam de ser um fim em si mesmos e passam a ser meios para ampliar a formação dos alunos e sua interação com a realidade, de forma crítica e dinâmica, possibilitando o desejo de continuar aprendendo ao longo da vida.

Na execução dos projetos, fica explícita a possibilidade de mobilizar diferentes áreas do conhecimento para atingir os objetivos traçados e resolver os problemas que surgem. A interdisciplinaridade ocorre naturalmente, gerada por uma necessidade real.

Para Gardner, não adianta elaborar projetos maravilhosos de se ver, mas distantes da realidade que se ensina nas escolas, ou mesmo desligados dos assuntos escolares.

O que caracteriza o trabalho com projetos não é o fato da temática surgir dos alunos ou professores, mas o tratamento dado a esse tema, visando torná-lo uma questão do grupo como um todo e não apenas de alguns ou do professor. Nesse sentido, os problemas ou temáticas podem surgir de um aluno em particular, de um grupo de alunos, da turma, do professor ou da própria conjuntura. O que se faz necessário garantir é que esse problema passe a ser de todos, com um envolvimento efetivo na definição dos objetivos e das etapas para alcançá-los, na participação das atividades vivenciadas e do processo de avaliação. De nada adianta ter um projeto bem elaborado, redigido impecavelmente se na prática não interessa aos alunos.

Há de se entender que a pedagogia de projetos não pode ser uma técnica, sujeita a regras predeterminadas, inflexíveis. Os projetos são processos contínuos que não podem ser reduzidos a uma lista de objetivos e etapas. É uma postura que reflete a concepção de conhecimento como produção coletiva, quando a experiência vivida e a produção cultural sistematizada se entrelaçam dando significado às aprendizagens construídas, as que servem não só à resolução dos problemas daquele projeto específico, mas que poderão ser aplicadas em outras situações, tornando assim, os alunos capazes de estabelecer relações e utilizar do conhecimento apreendido sempre que necessário.

Assim, os projetos de trabalho não se inserem apenas numa proposta de renovação de atividades, tornando-as mais criativas. Vão além: fazem parte de uma nova concepção de educação que exige um repensar da prática pedagógica e das teorias que a estão embasando.

Segundo Edgar Morin, (2000) para que os professores possam atender aos pressupostos necessários à sociedade do conhecimento é preciso internalizar-se de um paradigma inovador denominado de Paradigma Holístico:

“esse paradigma sustenta o princípio do saber do conhecimento em relação ao ser humano, valorizando a sua iniciatividade, criatividade, detalhe, complementaridade, convergência, complexidade. Segundo alguns autores teóricos, o ponto de encontro de seus estudos sobre este paradigma emergente é a busca da visão da totalidade, o enfoque da aprendizagem e a produção do conhecimento”.

É fundamental à escola ser um espaço de formação e informação, onde a aprendizagem de conteúdos necessariamente favoreça a inserção do aluno no dia a dia das questões sociais marcantes e em um universo cultural maior. A formação escolar deve propiciar o desenvolvimento de capacidades como as de relação interpessoal, as cognitivas, afetivas, motoras, éticas e estéticas, de modo a favorecer a compreensão e a intervenção nos fenômenos sociais e culturais. Isto só se torna possível mediante o processo de construção e reconstrução de conhecimentos.

O trabalho com projetos é riquíssimo, mas para ser realmente eficaz espera-se que o professor: contextualize os conteúdos articulando-os nas diferentes disciplinas; diversifique as atividades, utilizando novas metodologias, estratégias e materiais de apoio; domine tecnologias que facilitem a aprendizagem dos alunos; acolha e respeite a diversidade, utilizando-a pra enriquecer sua aula; maneje bem a classe sabendo lidar com o imprevisto; administre seu desenvolvimento profissional criando planos de estudo e trabalho; envolva-se nas questões da escola, desempenhando outras funções além das tradicionais da sala de aula; trabalhe em equipe com os outros professores; estabeleça uma parceria constante com os pais e a comunidade. Não é um trabalho fácil, mas possível e bastante gratificante.

A pedagogia de projetos pode não ser a solução para todos os problemas educacionais de nosso país, mas, certamente, é um grande avanço, uma mudança significativa, que dá conta de alguns objetivos educacionais com maior profundidade, em particular: o desenvolvimento da autonomia intelectual, o aprender a aprender, o desenvolvimento da organização individual e coletiva, bem como a capacidade de tomar decisões e fazer escolhas com o propósito de realizar pequenos ou grandes projetos pessoais.

Há de se tentar construir um futuro mais culto, mais educado, sem deixar de ser humano e delicado. Há de se engajar na luta de projetar e agir, apaixonadamente… Está lançado o desafio!

 

Paty Fonte – Educadora especialista em pedagogia de projetos, escritora, autora dos livros “Projetos Pedagógicos Dinâmicos: a paixão de educar e o desafio de inovar”, “Pedagogia de Projetos – Ano letivo sem mesmice” e “Competências Socioemocionais na escola” –  publicados pela editora WAK; autora e tutora de cursos presenciais e on-line de educação continuada a docentes, coach, palestrante. Idealizadora do site ppd.net.br

Instagram: @patyfonte_ppd 

 


Referências:

DEWEY, John. The child and the curriculum: the school and society. Chicago: The Chicago University Press, 1956.

GADOTTI, Moacir. História das ideias pedagógicas. São Paulo: Ática, 1993.

GARDNER, Howard. Inteligências múltiplas: a teoria na prática. São Paulo: Artes Médicas, 1997.

HERNANDEZ, F.; VENTURA, M. A organização do currículo por projetos de trabalho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

HERNANDEZ, Fernando. Transgressão e mudança na educação: os projetos de

trabalho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1998.

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Tradução de Catarina Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: Unesco, 2000. Título original: Les sept savoirs nécessaires à l’éducation du futur.

PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Porto Alegre: Armed, 2000.

 

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